
Em 1991, estudei no grupo EMME, onde conheci o Gerson. Nos casamos em 1994 e desde então servimos a Deus na Palavra da Vida. Em 1997, engravidei e tive uma gestação muito tranquila, fazendo todo o acompanhamento de praxe. Em 06/01/1998, nasceu Rebeca com 3.660kg. Na consulta de um mês de vida, o pediatra constatou um sopro no coração. Com os exames, fomos informados que ela tinha uma má formação congênita grave no coração e começamos o acompanhamento com o cardiologista.
Aos quatro meses, ela teve bronquiolite, mas por causa de sua cardiopatia grave, precisou ser internada, chegando a fazer uma primeira cirurgia cardíaca apenas para conseguir se recuperar do pulmão. Esse processo levou 45 dias de UTI.
Senti pela primeira vez na minha vida que me faltava o chão. Parecia que minha vida tinha sido suspendida, porque agora minha rotina de domingo a domingo eram as duas visitas de 30 minutos na UTI da Beneficência Portuguesa para ver minha bebê à beira da morte.
Mas ela saiu da UTI e ficou internada ainda 15 dias no quarto. Depois disso, a cada resfriado, ela precisava ser internada para acompanhamento. Foi aí que eu aprendi a abrir mão dos meus planos e agendas. Eu sofria demais com planos não concretizados. Ainda sofro, mas numa medida bem menor.
“O coração do ser humano pode fazer planos, mas a resposta certa vem dos lábios do Senhor.”
Provérbios 16:1
Neste momento, foi muito importante ter uma base bíblica forte, apesar de ter crescido com a ideia de que se eu fizesse tudo sempre certo, tudo sempre daria certo… Esse foi o primeiro equívoco que Deus corrigiu na minha visão distorcida de quem eu sou e quem Ele é: não passo de um vaso nas mãos do oleiro.
“Ai daquele que discute com o seu Criador, sendo um simples caco entre outros cacos de barro! Será que o barro pergunta ao oleiro:
“O que você está fazendo?” Ou diz: “Este seu vaso não tem alça!”
Isaias 45.9
Aos 11 meses, foi feita a primeira cirurgia de correção, mas ela teve complicações. Todas as complicações possíveis, aconteceram com ela… Hoje, creio que tenha sido para termos tempo de nos despedir dela. Esse processo de mais 45 dias de UTI trouxe muitos questionamentos: Por quê? Para que? Até quando?
A experiência pessoal mais marcante que tive com Deus foi dentro do ônibus que ia da Avenida Angélica até a Avenida Paulista (era um percurso de mais de 30 minutos). Eu estava muito cansada emocionalmente… não conseguia parar de chorar, então orei: “Senhor, não aguento mais. Se o Senhor não vai mudar a situação, muda o meu coração”. Depois de 5 minutos, me vi cantarolando no ônibus. Devem ter achado que eu era louca…
“Não fiquem preocupados com coisa alguma, mas, em tudo, sejam conhecidos diante de Deus os pedidos de vocês, pela oração e pela súplica, com ações de graças. E a paz de Deus, que excede todo entendimento, guardará o coração e a mente de vocês em Cristo Jesus.”
Filipenses 4.6-7
Depois de 45 dias de UTI, ela faleceu.
Confesso que não lembro muito bem de conseguir testemunhar objetivamente de Jesus neste período. Que Deus me perdoe por isso. Lembro de nos deixarem gravar uma fita para ficar tocando perto do ouvido da Rebeca com os cânticos que ela gostava tanto, e de consolarmos a médica que nos deu a notícia do falecimento da Rebeca.
Depois da morte da Rebeca, mandamos uma foto dela sorrindo, como lhe era peculiar, para a UTI, com uma carta buscando dar um testemunho mais claro da nossa fé.
Busquei viver um dia de cada vez. Para minha surpresa, o mais difícil não foi o primeiro mês, porque havia muitas pessoas em volta me apoiando, mas chegou a hora da vida voltar ao normal…VIDA NORMAL? Porque eu não tinha um normal para onde voltar… Me ressenti com Deus por um tempo porque eu não tinha dúvida de que Deus poderia ter curado a Rebeca. Eu não entendia por que Ele não quis. Esqueci muitas vezes da verdade de que Deus é bom.
“Ninguém é bom, a não ser um, que é Deus.”
Marcos 10:18
Não posso afirmar com clareza o porquê de passarmos por esta prova. Posso apenas declarar que se não tivéssemos passado, talvez ainda hoje eu não tivesse aprendido a olhar para o alto. A certeza do céu ameniza em muito a dor da saudade.
Para que? Quero crer que foi para eu aprender a depender de Deus, confiar no seu amor por mim, confiar que ele é BOM, amadurecer minha fé tão frágil. Hoje, a lembrança de ser estrangeira neste mundo me acompanha todos os dias.
“Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo.”
Filipenses 3:20
Não lembro quantas vezes pedi a Deus para eu trocar de lugar com ela. Deus não me atendeu nem fez os milagres que pedimos, mas fez outros vários milagres: no meu coração, no coração do Gerson, e nos deu mais três filhos saudáveis.
A Rebeca nunca teria uma vida normal. Ela sempre seria a doentinha, fraquinha. Deus a libertou desse tabernáculo com defeito e trocou por outro perfeito! Isso me consola!!!
Foi importante também lembrar que não fomos nem seremos os únicos a passar por esse tipo de sofrimento. Nosso mundo é caído, assim como nossos corpos, mas Deus é BOM! Por isso, muitas vezes, Ele não vai agir como esperamos.
“Porque os meus pensamentos não são os pensamentos de vocês, e os caminhos de vocês não são os meus caminhos”, diz o Senhor.”
Isaias 55:8